DISCUSSÃO
As luxações isoladas da AIFD são lesões incomuns, devido à sua estabilidade articular intrínseca provida pelos ligamentos colaterais e placa volar, que impedem a hiperextensão e o estresse lateral, além do curto braço de alavanca sobre a AIFD. Além da estabilidade intrínseca, a AIFD tem estabilidade extrínseca produzida pelo equilíbrio entre os tendões flexor profundo e extensor.
Num estudo realizado por Chen e colaboradores, de 1317 pacientes avaliados num período entre 2008 e 2013, apenas 30 casos (2,3%) eram de luxação da AIFD5.
Geralmente ocorrem em acidentes desportivos, sendo principalmente luxações dorsais; luxações volares são mais comuns em traumatismos por esmagamento ou por mecanismo rotacional, sendo geralmente expostas5.
A paciente relatou traumatismo direto, não relacionado à prática desportiva, ocasionando luxação dorsal da AIFD. Apesar de redutível, apresentava-se muito instável. Isto pode ser explicado pelo fato de, na AIFD, a placa volar ser confluente com a porção terminal do tendão flexor profundo, inserindo-se na falange distal e não dispor anatomicamente de ligamentos-estanque próprios para inserção na falange média, predispondo à sua avulsão desta falange e à instabilidade5,6,7.
A luxação da AIFD pode ser irredutível quando ocorrer interposição da placa volar ou do tendão flexor profundo, ou quando os côndilos da falange média se insinuarem pelo tendão flexor6,7,8. No caso da paciente, por ser uma lesão redutível, excluímos estas possibilidades.
Após a redução, testa-se a estabilidade, aplicando-se estresse sobre a placa volar e ligamentos colaterais5. Na paciente, apesar da instabilidade anteroposterior, não havia sinais clínicos sugestivos de lesão dos ligamentos colaterais nem de irredutibilidade. Assim, optou-se pelo tratamento incruento, não havendo indicação de exploração cirúrgica da articulação6,7.
A estabilização cirúrgica da luxação dorsal da AIFD pode ser feita de diversas maneiras, sendo uma das opções a fixação transarticular por um fio de Kirschner inserido pela extremidade da falange distal6,7. Kobayashi, em 20149, modificou o método de Suzuki10 para as fraturas-luxações interfalangeanas proximais, aplicando uma tração ajustável para permitir a mobilização ativa da articulação. Xiong e colaboradores11 e Tonogai e colaboradores12 modificaram a técnica de Ishiguro13, geralmente aplicada para o dedo em martelo, utilizando um fio de Kirschner para bloqueio da extensão, mantendo a redução da AIFD e permitindo flexão ativa, recomendando esta técnica para casos agudos de fratura-luxação AIFD dorsal.
Em se tratando de uma lesão crónica redutível e instável, optamos pelo tratamento com fixação interfalangeana distal por um fio de Kirschner dorso-volar, transarticular, mantendo a articulação em extensão. Uma redução aceitável e estável, sem interferir com a matriz e o leito ungueais. Consideramos este procedimento tecnicamente mais simples e favorável do que a inserção de um fio de Kirschner pela extremidade distal da falange distal.
Na avaliação final, a paciente encontrava-se sem queixas e com arco de movimento funcional aceitável, com flexão indolor e sem instabilidade recorrente ou subluxação articular.
Consideramos importante o diagnóstico e tratamento destas lesões o mais precoce possível, tentando-se a redução incruenta sob anestesia troncular primariamente. No caso de redução instável, considerar lesão dos ligamentos colaterais e/ou placa volar; em luxações irredutíveis, considerar interposição de partes moles.
Concluímos ser o tratamento cirúrgico da luxação da AIFD crônica instável cirúrgico e que a fixação dorso-volar transarticular com um fio de Kirschner é tecnicamente simples e com bom resultado funcional pós-operatório.