DISCUSSÃO
O tratamento da braquimetacarpia congénita isolada deve ser adequada a cada doente e às suas expetativas, tendo como objetivo a harmonização estética da mão e a sua melhor funcionalidade.
Alguns autores referem o predomínio desta patologia no sexo feminino1,6. Não existe um consenso relativo à idade para a realização do alongamento ósseo, contudo alguns trabalhos indicam o período da adolescência como preferencial, devido à acelerada formação de regenerado e consolidação óssea, à proximidade temporal para o encerramento da placa epifisária e à motivação e capacidade do doente e família para cooperar e cumprir as indicações e cuidados com o fixador externo6,9. O encerramento das epífises metacárpicas ocorre entre os 14 e 21 anos de idade, sabendo-se que crianças esqueleticamente mais maduras necessitam de mais tempo para consolidação óssea2. Por outro lado, quando o alongamento é realizado durante o período de maior crescimento ósseo da criança este está associado a um maior risco de cirurgias secundárias6. O uso da técnica de osteogénese por distração tem produzido resultados satisfatórios no tratamento da patologia da mão, nomeadamente de deformidades congénitas, amputações traumáticas, queimaduras e sequelas de infeção2. Contudo, exige a cooperação do doente e da família no pós-operatório. Estes devem entender o funcionamento do sistema de alongamento do fixador externo, saber higienizar os pinos de fixação óssea, identificar as complicações e sinais de alarme e terem disponibilidade para se dirigirem com facilidade a uma instituição hospitalar se necessário. Ao contrário do alongamento progressivo realizado pela técnica de osteogénese por distração descrita, existem opções de alongamento ósseo mais céleres (em um tempo), que permitem um alongamento imediato. Este método de alongamento agudo encontra-se limitado à possibilidade de alongar cerca de 10mm, requerendo ainda a aplicação e fixação de enxerto ósseo e frequente libertação de tecidos moles e reconstrução ligamentar, estando associado a uma maior taxa de complicações2. Relativamente à osteotomia subperióstica, esta foi realizada com serra, existindo outras opções como a utilização do osteótomo e martelo que permite prevenir a potencial necrose óssea por lesão térmica associada à utilização da serra. Para evitar esta complicação, utilizou-se uma baixa rotação no corte com serra e uma irrigação contínua com soro para evitar a necrose dos topos da osteotomia. Considera-se ainda a utilização da serra como vantajosa especialmente em ossos tubulares de pequena dimensão e relativa fragilidade, permitindo um corte com movimentos controlados e de grande precisão.
No caso descrito obteve-se um alongamento ósseo de 16mm, o que corresponde a 44,4% do comprimento inicial do metacárpico e embora a literatura refira que não deve ser excedido um alongamento superior a 40% do osso original pelo risco de contractura ou défice de amplitude articular, não verificámos nenhuma destas complicações na nossa doente. O tempo de consolidação foi de 105 dias e o healing índex de 65,6 dias/cm. Segundo Bozan, a idade correlaciona-se positivamente com o healing índex e com o tempo de consolidação2, verificando-se que em crianças mais jovens o healing index e o tempo de consolidação é mais curto do que em crianças esqueleticamente maduras. O tempo de consolidação encontra-se ainda dependente do local da osteotomia, estando descrita a metáfise proximal como a zona mais favorável pelas vantagens biológicas associadas ao melhor suprimento sanguíneo, associando-se a um menor tempo de consolidação8. Quanto ao ritmo de alongamento ideal, não existe consenso na literatura, estando descritas variações entre 0,3mm a 1,5mm/dia2,6, devendo este ser individualizado à realidade de cada doente, uma vez que a limitação dos tecidos moles em acompanhar o ritmo de alongamento ósseo é variável, podendo condicionar contratura dos músculos interósseos e lumbricais ou tensão periostal6. Independentemente do ritmo de alongamento ósseo definido ab initio este deve ser adaptado à tolerância do doente à dor, ocorrência de parestesias, palidez cutânea ou outra intercorrência social ou psicológica que o justifique6,7. No caso descrito, o ritmo definido de 0,5mm/dia (0,25mm de 12/12h) permitiu o alongamento ósseo progressivo de 16mm sem intercorrências álgicas ou neurovasculares. No sentido de evitar intercorrências ósseas após o alongamento (pseudartrose ou fratura do regenerado), o tempo de consolidação definido foi o de 3 vezes o tempo de distração (105 dias). Este protocolo permitiu um excelente resultado funcional e satisfação da doente com o procedimento cirúrgico. A infeção superficial adjacente aos pinos de fixação óssea, à semelhança da que se verificou no nosso caso, é a complicação mais comum descrita na literatura, ocorrendo em 25-50% dos casos10. Em contraste, a infeção profunda de tecidos moles ou osteomielite são eventos raros com uma prevalência de 0-11%10.
A técnica de osteogénese por distração tem um papel importante no tratamento de deformidades congénitas da mão do adolescente, com excelentes resultados estéticos e funcionais no tratamento da braquimetacarpia congénita. Por fim, realça-se que estes resultados só podem ser obtidos através de uma técnica cirúrgica meticulosa indicada num doente e família com capacidade cognitiva para colaborar, compreender e integrar os cuidados diários necessários ao manuseamento e utilização de um fixador externo para o efeito de alongamento ósseo.